quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Rio de Janeiro

quinta-feira, 31 de dezembro de 2009
Ano bom. Tornei-me menos estúpido no seu correr. Travei guerras improváveis, algumas verdadeiramente cômicas — a graça do espírito tem dessas aventuras. Sinto-me, contudo, cada vez mais em ostra, cada vez mais hermético. Cada vez mais um filme de Godard.

A infância retorna em momentos como o de agora, em que tenho de arrumar a mala, escolher peças florais, vestir zilhões de sungas para saber qual encolheu desde o último verão — sim, pois não engordamos, as roupas que encurtam. E dessas banalidades a vida vai ganhando tons dourados deliciosos.

Tão dourados que me detive ao colocar na mala o livro que estou relendo — De Profundis, de Oscar Wilde —, por considerá-lo cinzento demais, muito embora, em leitura atenta e entregue, se observe nele algo comparado aos primeiros raios de sol a perfurarem as nuvens negras de uma tempestade finda, como se a luz fosse graciosamente irremediável depois da tormenta.

"Eu tenho o direito de partilhar a Dor, e aquele que é capaz de olhar para os encantos do mundo, e partilhar a tua dor, e compreender um pouco a maravilha de ambos, está em contato direto com as coisas divinas, e chegou tão perto do segredo de Deus quanto alguém pode estar."

E quem estará? Prefiro pensar essa dúvida com os pés afundados na areia à espera de uma batida de limão, enquanto olho para o céu e, reparando Deus em tudo, agradeço apenas por não estar chovendo.

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